terça-feira, 9 de março de 2010

Prós e Contras: À Procura da Estabilidade

A Comissão Europeia espera que o Programa de Estabilidade e Crescimento português obtenha um largo consenso político e evite os erros cometidos pela Grécia, mas o debate Prós e Contras (8 de Março), que opôs os representantes do governo - Jorge Lacão - e do PS - Francisco Assis - aos partidos da oposição - Miguel Frasquilho (PSD), José Manuel Pureza (BE), Pedro Mota Soares (CDS) e Bernardino Soares (PCP) - revelou a existência de um excesso de conflitualidade e de falta de sentido da responsabilidade política. As linhas mestras do PEC expostas pelo Ministro dos Assuntos Parlamentares não geraram o consenso parlamentar alargado, pelo menos neste debate televisivo: a oposição de Direita e de Esquerda acusou o governo do PS de ter sido obrigado a mudar de rumo por causa da pressão internacional das agências de rating, sem no entanto apresentar alternativas credíveis. O PSD defende a reforma da administração pública e a redução drástica do número de funcionários públicos, o BE advoga a tributação pesada das mais-valias bolsistas e da banca, o CDS aprova o apoio às pequenas e médias empresas, e o PCP propõe praticamente a saída de Portugal da zona Euro e da União Europeia. No fundo, os parlamentares portugueses desejam histrionicamente que a Alemanha de Merkel continue a sustentar o país, ou melhor, o sistema estabelecido que lhes garante benefícios privados e visibilidade pública, em detrimento do todo nacional: a crise financeira e económica não alterou o seu modo de pensar o interesse nacional e o futuro de Portugal. Os partidos da oposição de Esquerda fazem propostas que aumentam a despesa pública, enquanto os partidos da oposição de Direita continuam a ansiar pelo modelo económico neoliberal que foi refutado pela actual crise financeira e económica: a economia ultra-social da Esquerda e a economia das privatizações da Direita são economias mágicas que arruinaram e continuam a arruinar Portugal. O arcaísmo das pseudo-elites do poder sediadas em Lisboa revela-se neste pensamento mágico - comer tudo aquilo que não se produz, que pode ser tematizado em termos de cargo cult ou culto do cargueiro: os deputados e os políticos portugueses querem apoderar-se das riquezas materiais produzidas nos países desenvolvidos e consumi-las, em vez de colocar o país a produzir riqueza nacional. Quando confrontado com os deputados portugueses e os seus debates parlamentares, o antropólogo é forçado a converter-se em zoólogo e, face à gravidade da patologia parlamentar, em médico veterinário: a Assembleia da República é, por natureza, o jardim zoológico nacional.
Perante a histeria dos deputados da oposição, Francisco Assis procurou mostrar que o PEC estabelecia um ponto de equilíbrio entre as perspectivas irracionais em conflito dos partidos da oposição. A tentativa de conciliar as irracionalidades das oposições pode gerar mais irracionalidade: exigir sacrifícios aos portugueses em nome de um crescimento económico medíocre. Comprimir a despesa pública, tributar as mais-valias bolsistas, congelar os salários da função pública, reduzir os benefícios fiscais e privatizar: eis aqui algumas linhas mestras do PEC que não criaram o consenso alargado desejado pelo governo. Todas as medidas propostas satisfazem mais os interesses da Direita que os interesses da Esquerda. O BE e o PCP têm alguma razão quando falam do Orçamento de Estado e do PEC da aliança entre o PS, o PSD e o CDS, mas perdem o bom-senso quando procuram desmistificar a suposta mistificação: o facto dos portugueses viverem acima das suas possibilidades. O facto dos pobres estarem prisioneiros do ciclo infernal da necessidade não constitui prova contra este facto evidente: os que vivem acima das possibilidades nacionais são todos aqueles que se libertaram magicamente - isto é, corruptamente - do reino da necessidade. O culto do cargueiro que seduz os incapacitados indígenas portugueses pode conduzir ao naufrágio do universo económico e cultural de Portugal. Sem crescimento económico significativo, o PEC não é capaz de salvar Portugal do naufrágio. Em 2013, teremos a identidade sempre-já consumada entre Portugal e a Grécia.
O PEC visa reduzir o défice orçamental (3%) e a dívida pública (60% do PIB) até 2013, mas não propõe um programa de crescimento económico sustentável para todo o país. As privatizações previstas, em especial a privatização dos CTT e de sectores da CGD, da EDP, da TAP e da GALP, e o adiamento por dois anos da construção da linha de TGV Lisboa-Porto e Porto-Vigo, implicam necessariamente o fortalecimento musculado do poder centralizado e o empobrecimento das regiões portuguesas que não sejam Lisboa: a construção imediata da linha de TGV Lisboa-Madrid e do novo aeroporto penalizam especialmente o Norte e o Porto. Não adianta tentar justificar este adiamento pelo condicionamento imposto pelo atraso do programa espanhol, como fez Jorge Lacão: Portugal começa a acordar desse pesadelo que é a exploração económica e a opressão lisboetas. Se o poder central continuar a reduzir Portugal a Lisboa, condenando o resto do país à miséria, ao desemprego, à pobreza, ao suicídio, à violência e à fome, então os portugueses que não são lisboetas devem olhar para as revoltas estudantis e populares que incendiaram Paris e Atenas. A luta contra a exploração lisboeta pode gerar um largo consenso nacional em torno ou da independência ou da regionalização. O comportamento saloio e provinciano de Lisboa, a velha prostituta que atrai todos os corruptos e medíocres do país, envergonha a pátria: a depressão dos portugueses, bem como a sua baixa-auto-estima e a sua falta de orgulho nacional, é gerada pela gula asteca de Lisboa. Aqui no Porto e no Norte o povo começa querer realizar o seu grande sonho: construir a sua própria nacionalidade e romper totalmente com Lisboa. Os portugueses não-lisboetas não devem continuar a entregar e a confiar os seus destinos nas mãos da capital centralizadora e os poderes autárquicos podem ajudar a organizar essa luta contra o Estado centralizado. O modelo de desenvolvimento económico capaz de fazer arrancar economicamente o país e de o modernizar exige a superação do modelo francês de uma capital asteca: o país é demasiado pobre para sustentar a gula exploradora de uma capital incapaz de trazer a prosperidade nacional equilibrada. Cisão nacional e luta contra o poder central opressor: eis a única via que resta a Portugal para recuperar a sua dignidade. A modernização de Portugal joga-se neste combate de vida ou de morte contra o poder explorador e opressor da capital canibal.
J Francisco Saraiva de Sousa

6 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Introduzi novos conceitos para criticar a economia, mas não os desenvolvi, porque eles só podem ser pensados no âmbito da decadência cultural do ocidente.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Nós aqui no Porto estamos cada vez mais ligados à Galiza e a Castela e Leão: dispensamos a ligação Porto-Lisboa. É bom que a capital cometa mais erros, porque deles nascerão a revolta do Norte e a sua luta pela autonomia. A Ibéria precisa de um terceiro Estado. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Unidade nacional na escassez e na exploração? Não queremos essa unidade nacional: o conflito total promete gerar um novo mundo! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A periferia combate-se com as autonomias - as autonomias anulam a periferia.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A propósito do post anterior, descobri uma carta de Engels onde ele diz que, se tivesse lido antes Schleiermacher, nunca teria aderido ao racionalismo. Mais um indicador da existência da corrente quente no marxismo. Falta decidir entre a utopia da ressurreição dos deuses e a utopia de religiões sem igrejas! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Há dias negros e hoje foi um desses dias: o FCPorto foi vergonhosa e justamente derrotado pelo Arsenal por 5-0. Para dizer a verdade, já estava à espera desta derrota, até porque a política de contratações foi péssima. Os responsáveis já devem ter tomado medidas radicais para libertar o FCPorto dessa malta incompetente!