segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Hipótese do Cérebro Social

Quando se pretende dizer que o homem é um animal social, recorre-se geralmente à célebre frase de Aristóteles: «O homem é, por natureza, um ser vivo político», porque «só o homem, de entre todos os seres vivos, possui a palavra» (Política). É certo que esta frase tem sido muito mal compreendida, até porque a segunda parte que justifica, isto é, fornece a razão de ser de uma tal «natureza» excepcional do homem, foi quase sempre omitida, mas, apesar disso, a mera referência a Aristóteles permite-nos compreender e demolir a estratégia anexionista das chamadas ciências sociais e humanas: apropriaram-se indevidamente de território que pertence à Filosofia, vulgarizaram-no e não acrescentaram mais-valia de conhecimentos relevantes. São, como diria Althusser, disciplinas «sem objecto», ou seja, meras técnicas de adaptação social que ajudaram a construir o actual estado de burocratização, precisamente o inimigo do pensamento crítico.
Diante deste estado de apatia cognitiva, a Filosofia deve reconquistar o seu território, expulsar os invasores e procurar dialogar com as verdadeiras ciências. E, no domínio do "social", uma dessas ciências é a neurociência social. Embora não pretenda apresentar esta neurociência relativamente recente, o que farei provavelmente no meu blogue NeuroFilosofia, apenas quero destacar a hipótese do cérebro social (ou hipótese da inteligência maquiavélica) que a Filosofia deve «acarinhar» e ajudar a elaborar, «relendo-a» na sua própria história, de modo a clarificar os seus conceitos, bem como as suas metodologias.
O cérebro dos primatas, sobretudo o do homem, beneficiou muito da própria estrutura social primata e dos seus traços específicos, e o seu tamanho e a sua complexidade reflectem a complexidade dessa organização social. As neurociências já destacaram algumas estruturas neurais que desempenham um papel fundamental na orientação dos comportamentos sociais: a amígdala, o córtex frontal ventromedial e os córtices somato-sensoriais. Muito sumariamente podemos dizer: a amígdala desempenha um papel chave nos julgamentos ou juízos sociais das faces, o córtex pré-frontal ventromedial desempenha o papel chave nos raciocínios sociais e na tomada de decisões, levando em conta as experiências emocionais, como mostrou António Damásio, e os córtices somato-sensoriais desempenham o seu papel na empatia.
Este conjunto de habilidades pode ser integrado na cognição social. De facto, a neurociência cognitiva estuda como as habilidades cognitivas sociais se desenvolvem ao longo da infância e quais os factores genéricos que as influenciam. E é neste domínio da cognição social que a Filosofia deve dar o seu maior contributo, aderindo às novas tecnologias e às novas metodologias, podendo brilhar na elucidação do modo como nós representamos as mentes dos outros (Theories of Mind).
Anexo: A Filosofia deve distanciar-se das Faculdades de Letras e das Ciências Sociais e ser integrada nas Faculdades de Ciências e/ou de Matemática.
As alternativas profissionais que os cursos de Filosofia oferecem, nomeadamente relações públicas, são tarefas para ser executadas por escravos e não por filósofos. Os professores universitários portugueses de Filosofia revelam nestas propostas a sua imbecilidade congénita. O seu lugar não é na academia, mas num hospício para atrasados mentais, que, sem competências, se apoderaram por métodos escusos de empregos garantidos e sem real avaliação. As Tias-do-Chá e os Pandas devem ser denunciados e humilhados publicamente, pelo lixo dos seus trabalhos publicados, pela falta de qualidade das suas aulas, meras projecções da sua substância protoplasmática diabolizada, e pela incompetência manifestada pelos seus licenciados, mestres e doutores. Mais: os seus crimes, bem como as suas ligações corruptas a outras instituições obscuras, devem tornar-se públicos e alvo de punições disciplinares.
E, para evitar que a Filosofia seja seguida pelos mais néscios dos alunos, torna-se necessário obrigá-los a estudar matemática e ciências, com domínio pleno da estatística e de outros métodos quantitativos. Platão não estudava "porcaria", mas matemática. Por isso, é muito estranho que se ensine Platão sem se saber matemática! Estou certo que não será este governo a levar a cabo estas reformas estruturais do ensino, mas a denúncia fica feita neste país que nega o futuro desafogado, devido à mediocridade das suas elites incultas mas diabólicas. (O mesmo poderia ser dito de outros cursos. Mas coube-me aqui salvar a honra da minha dama: a Filosofia.)
J Francisco Saraiva de Sousa

12 comentários:

Helena Antunes disse...

"...chamadas ciências sociais e humanas: apropriaram-se indevidamente de território que pertence à Filosofia, vulgarizaram-no e não acrescentaram mais-valia de conhecimentos relevantes. São, como diria Althusser, disciplinas «sem objecto», ou seja, meras técnicas de adaptação social que ajudaram a construir o actual estado de burocratização, precisamente o inimigo do pensamento crítico."

Está a dizer mal das ciências sociais, Francisco?! Huum... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

É preciso mudar de paradigma e é isso que proponho: mudança de paradigmas e unidade disciplinar. Só assim podem esses cursos fazer face aos desafios actuais.
É melhor para o futuro das Humanidades, creia Helena, muito melhor. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Aliás, muitos desses departamentos nos USA ou Inglaterra já começam a mudar. É preciso mudar os currículos e reformar os professores có-có. :)))

Helena Antunes disse...

Agora fez-me lembrar Kuhn ao falar em mudança de paradigmas! :)

A este nível ainda há muita resistência à mudança. E para quem tem interesse em legitimar e perpetuar o status quo, aqueles que se apresentam como adeptos da mudança são vistos como inimigos, estranhos. Ficam de fora do sistema.

Faz-me lembrar a política. Ainda um destes dias lia (n'O Público, se não me engano)que os políticos são vistos pelos portugueses como os mais mentirosos.
A política e os seus homens são vistos na base da mentira e da corrupção. E quem foje deste paradigma não tem lugar na política. Também aqui a mudança devia ser encetada mas ainda há resistência. Até mesmo muitos jovens (infelizmente) estão a enveredar por este caminho.
Ainda um dia destes falava com um amigo meu, também da esfera política, acerca de um político do nosso distrito. Eu elogiava esse político pelo seu discurso e posição política, porque o conheço somente pelo seus discursos e pelas suas presenças em muitos encontros políticos onde estive e sempre me pareceu uma pessoa muito assertiva.
O meu colega dizia-me que eu andava muito enganada, que esse indivíduo em questão era uma autêntico animal político, e que dificultou muito umas situações aqui no nosso concelho. Fiquei estupefacta.
O meu colega dizia "Mas isto não se pode falar cá para fora. Temos de apoiá-lo e fazer de conta que gostamos dele, e dizer bem dele".
E eu questiono-me porquê? Porque é que estas situações e estas pessoas não são denunciadas? É por estas e por outras que muitas vezes acho que não serei nada na política, porque isto é contra os meus princípios. Vejo a política de uma forma diferente, queria fazer parte de uma vida política diferente.
A mudança na política precisa-se!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Devemos fazer crítica construtiva. Os portugueses, sobretudo os instalados, devem habituar-se à crítica e assumir as suas responsabilidades na porcaria que fazem.
Não desista! A blogosfera proporciona o meio mais eficiente para levar a cabo essa nova política.
A atitude do seu amigo é a do "efeito manada". O seu cérebro é do tamanho do cérebro de um réptil. Conformismo e oportunismo totais!
A luta continua! :)

E. A. disse...

:DDDD "cérebro de um réptil"!!! O Francisco é muito engraçado e hiperbólico, deveria pensar em escrever para teatro.

[Não me leve a mal, sabe que levo a sério a sua luta. :)]

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sei... Pelo que a Helena disse, o homem não é boa pessoa! :)

E. A. disse...

...Esse "sei" foi reticente.
Duvido da blogosfera, sim. Por isso o meu blog é o mais desinformativo possível, porque ao menos no paroxismo do cinismo talvez se faça luz alguma verdade.

Mas não duvido da sua inteligência e dos seus bons intentos, do seu amor à sabedoria. Não duvido da filosofia. Não duvido da humanidade.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não foi reticente. Também sei que não duvida da humanidade e da filosofia. Afinal, se fossemos céticos ou pessimistas, não blogávamos ou conversávamos uns com os outros.
Sei que há limites, os dos cérebros tugas apáticos, mas acredito na pedagogia de choque. Pode ser que acordem e comecem a lutar pala mudança. :)

E. A. disse...

Hummmmmmm... Sou profundamente céptica com pedagogias de choque. Mesmo, mesmo. Mas deve ser do meu ponto de vista feminino - defectivo, portanto. :)

Helena Antunes disse...

O meu amigo é boa pessoa, é bom amigo :)
Na política também revela algum sentido de mudança, mas dada a sua participação tão activa na política acaba por se aproximar do padrão instalado! É pena...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ele estáa tratar da vidinha dele, o que é legítimo, mas devia ser mais corajoso e pensar nos outros.
A pedagogia do choque dá bons resultados e os alunos gostam. Por isso, ainda não sou céptico. :)